domingo, 17 de abril de 2011

Páscoa e renovação

Domingo de Páscoa lembra cheiro de chocolate e almoço em família.

Lembra alegria, a mesa farta, o ruído de talheres, a tagarelice das crianças, as risadas, a descontração. Lembra infância.

Quando criança, meus irmãos e eu acordávamos bem cedo e corríamos pela casa, alvoroçados à procura das cestas de ovos e dos coelhinhos de chocolate, escondidos na véspera, por minha mãe. A alegria era geral. Cada um querendo mostrar seu “ninho” repleto de coisas deliciosas aos amigos.

Nos domingos de Páscoa, os almoços em família eram verdadeiramente considerados sagrados. Minhas avós vinham almoçar conosco e compartilhavam dessa alegria. Tradição que, mais tarde, meu marido e eu procuramos preservar, repassando aos nossos filhos, amparados pela importância da união e do amor em verdadeiros momentos de partilha.

Também me vem à lembrança que, nos dias que antecediam a Páscoa, pintávamos as cascas de ovos para enchê-los de amendoim doce ou pequeninas balas de goma. Esses ovos eram preparados às vésperas desse grande acontecimento. Quem utilizasse ovos, na culinária, deveria retirar a gema e a clara, delicadamente, através de um pequeno furo, lavando as cascas com cuidado, para receberem a pintura feita pela gurizada.

Essa prática de pintar as cascas de ovos cozidos, decorando-os com desenhos e formas abstratas, é um costume comum em muitos países. É uma alusão aos antigos rituais pagãos, nos quais o ovo trazia a idéia de começo de vida. Os povos antigos costumavam presentear os amigos com os ovos, desejando-lhes boa sorte.

Com o tempo, pela praticidade e pelo espírito de consumo, nós brasileiros passamos a substituir os ovos decorados pelos ovos de chocolate, expostos abundantemente nos corredores dos supermercados para estimular a gula de crianças e adultos. Não é à toa que, durante essa época, as indústrias aumentam consideravelmente o seu faturamento. Mesmo assim, algumas comunidades – geralmente de descendência nórdica - ainda cultivam a tradição de pintar ovos.

Minhas lembranças me deixaram um significado mais abrangente para a Páscoa do que atualmente as novas gerações a vivem, onde tudo já vem pronto e onde a família perde, com o tempo, o sentido de ritual e partilha. E, sobretudo, de reflexão sobre o momento crístico que está presente nesta comemoração.

Para mim a Páscoa é momento de renovação. É momento de introspecção. É momento de fazermos uma avaliação de nossas ações e sentimentos. É sermos capazes de mudar, de partilhar a vida na esperança. É tempo de investir na fraternidade, de ajudar mais gente a ser gente. É crer na vida que vence a morte.

A palavra Páscoa advém do nome hebraico pessach, alusivo à festa judaica, tradição que se renova para esses e, que também serviu de inspiração para os católicos, como símbolo de uma nova vida, que agregou às influências deixadas pelos pagãos (comemoração da passagem do inverno para a primavera) e pelos judeus (passagem da escravatura no Egito para a liberdade na terra prometida), como sucedâneo da paixão e morte de Jesus.

Segundo a tradição contemporânea, incorpora-se a essa passagem a lembrança da Via Sacra – caminho sagrado, em latim – que retrata o percurso feito por Jesus desde o Pretório de Pilatos até a sua morte no Calvário e seu sepultamento. Os símbolos trazidos a nós, por essa Tradição, representam, também, a nossa própria via crucis. O que Cristo viveu inspira-nos a ter coragem para seguirmos em frente, não nos deixando abater pelas dificuldades da vida. Devemos encarar nossos obstáculos seguindo pelo caminho do amor.

Uma ótima oportunidade para despertar novos projetos de vida. Assim como o ovo representa o renascer, a Páscoa é um convite para abandonarmos a nossa soberba, optando pela humildade, tornando-nos sóbrios e vigilantes, resistindo às forças que nos empurram para atalhos que não nos levam a lugar algum.

Sempre que ficarmos diante de apetitosos e convidativos ovos de chocolate, lembremos dos símbolos da Páscoa, que marcam a busca da felicidade, da harmonia, da essência da vida comunitária, seja na família, seja na vida deste País, seja na condição de habitantes deste Planeta que, de tempos e tempos, renovam as tradições e aperfeiçoam os símbolos que se tornam universais.

Um comentário:

  1. Como são importantes estes rituais de nossa infância! Hoje mesmo a Roberta estava contando que recheou as casquinhas de ovos que ela levou para os aluninhos pintarem. Depois, escondeu no jardim da escola e eles foram procurar...Lembrei muito de nós e de como passamos isso para nossos filhos.

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