domingo, 8 de abril de 2012

Pra não dizer que não falei...

          No começo dos anos 60, os sonhos de meus pais eram embalados pelas músicas românticas de Silvio Caldas, Orlando Silva, Dalva de Oliveira e, também, interpretes latinoamericanos, como Carlos Gardel, Juan D'Arienzo, Athaulpa Yupangi, Marcedes Sosa e tantos outros.
          Essas músicas eram melodiosas e letras exaltavam o coração, a paixão e o estar enamorado e todas as suas conquências. Com a chegada de nossa geração, queríamos mudar tudo isso e encontrar uma forma de expressão que, através da música, quebrasse paradigmas e representasse nosso mais irrequieto espírito de renovação.
          No início dos anos 60, foram iniciadas as bases para mundialização dos padrões e comportamentos. Surgiram nas rádios as músicas de um conjunto barulhento, cujos integrantes aboliram o cabelo penteado com a brilhantina ( década de 50) para deixarem-no formar volume desalinhado e disforme. Eram os besouros, ou Beatles, que deixaram meus pais de cabelo em pé, estarrecidos com aquela gritaria e música estridente. Muitas vezes me perguntaram: "isso é música"?
          E eu seguia me identificando com aquela novidade que veio a reformular padrões e comportamentos no mundo inteiro, a ponto de seu principal integrante dizer que " eram mais populares que Jesus Cristo".
          Agora, já na idade que tinham meus pais me coloco em seus lugares e repito seu gesto questionador, ao me deparar com as musicas hoje produzidas no Brasil e também me pergunto, estarrecida: " isso é música "?
          Sucessos midiáticos apresentam letras que se sustentam  na repetição enfadonha de um refrão e pouca musicalidade. Mas ficam grudadas na mente:  Eu quero tchan, eu quero tchun, eu quero tchan, tchun, tchun, tchun.... 
          O contraste de gostos e preferências sempre existiu entre as gerações, cabendo aos mais velhos o papel de se surpreender e questionar o novo que surge. Fico com o sentimento dúbio do contraste: surpresa com a má qualidade de certos sucessos atuais e saudosa das músicas de meu tempo de adolescência e início da vida adulta.
          Nem só de barulho e contestação viveu a minha geração.
          Ah, que saudades das letras bonitas, romanticas que expressam sentimentos, posicionamentos políticos ou descrevem as  belezas da natureza! Letras e músicas que nos levam a sonhar ou a chorar, nos fazem ficar com a pele arrepiada, literalmente.
          No final dos anos 60 e início dos anos 70, as músicas dos festivais da canção sacudiram milhares de espectadores, que lotavam ginásios de esportes para torcer por intérpretes e canções participantes. Lembro-me quando a música "Sabiá", de Tom Jobim e Chico Buarque, disputou o primeiro lugar com a música "Pra não dizer que não falei de flores", de Geraldo Vandré. A polêmica dividiu a platéia, críticos e até mesmo representantes de veículos de comunicação de massa na disputa pelo prêmio máximo da categoria. 
          Ambas  as músicas fazem parte de minha história e hoje ainda recordo os acontecimentos daquela época: Os gritos de protestos da platéia ainda ecoam em meus ouvidos contra os versos " Vou voltar, sei que ainda vou voltar para o meu lugar... Foi lá que eu ouvi cantar uma sabiá..".  e a favor de  "caminhando e cantando e seguindo a canção, somos todos iguais, braços dados ou não". Realmente, foram anos marcantes.
          E, mesmo quando cantadas em uma linguagem popular, mesmo arranhando no portugues correto, as músicas não perdiam a poesia: " O Arnesto mi convidô pro samba, ele mora no Braz... Nós fumu e não encontremu ninguém... Nós fiquemo cum uma baita de uma raiva, da otra vez nós num vai mais. Vivi a minha infância ouvindo meu pai cantar essa música de Adoniran Barbosa! 
          Quem nunca sentiu, por exemplo, uma dor de cotovelo imortalizada na música Nervos de Aço de Lupicínio Rodrigues: "Você sabe o que é ter um amor, meu senhor, ter loucura por uma mulher e depois, encontrar esse amor , meu senhor, nos braços de um tipo qualquer..."
          De lá para cá, até a última década, o romantismo sempre expressou emoções elevadas, o afeto e a consideração por pessoas amadas. Mas jamais foram cantadas, como agora, com tanta frieza, como vejo nos recentes músicas chiclete e besteirol, que grudam na cabeça.
          Hoje em dia, as gravadoras, pensando em atingir as massas, lançam músicas cujas letras são recheadas de duplo sentido ou apresentam refrão repetitivo, repletos de termos chulos. Não sou saudosista, mas dentro do possível, me considero antenada para as novidades que surgem. Não dá pra aguentar ouvir toda a hora alguém cantando: "Ai se eu te pego, ai se eu te pego! Delicia, delícia! " Um refrão criado em tom de brincadeira, sem nenhuma pretenção, por um grupo de meninas em férias e que, de repente, gravado por um cantor com carisma, virou hit internacional. 
          Recentemente, faleceu um compositor e cantor considerado pelos críticos como brega, mas que arrastava multidões. Tinha uma coleção de calcinhas que as fãs jogavam no palco em sua homenagem. Nem por isso suas músicas perderam o tom romântico de exaltar o amor. Mesmo sem gostar, quem nunca parou  por um instante para ouvir Wando ou cantarolar o refrão: "Eu quero me enrolar nos seus cabelos, abraçar seu corpo inteiro, viver de amor de amor me perder"?
          Preferia a sensibilidade de Gonzaguinha, que me tocou com esta pérola: "primeiro você me azucrina, me deixa na boca um gosto amargo de fel, depois vem chorando desculpas, querendo ganhar um bocado de mel..." Meu marido costuma dizer, quando ouve esta música, que essa ele me dedica. Será?
          Para contrapor essa dor do distanciamento, lembro-me de uma canção de Cazuza: "Quando a gente conversa, contando casos, besteiras,  tanta coisa em comum, deixando escapar segredos, eu não sei que hora dizer, me dá medo (que medo), é que eu preciso dizer que te amo!"
         Várias canções tem a capacidade de ajudar-nos a ver a vida com mais otimismo, servem para nos incentivar quando estamos cansados,quando as coisas não estão dando certo. Renato Russo imortalizou os versos, entre outros,  "Mas é claro que o sol vai voltar amanhã. Mais uma vez eu sei. escuridão já vi pior, de endoidecer gente sã. Espera que o sol já vem. Quem acredita sempre alcança."
          Com letra e música alegre, Os Tribalistas nos encantam e nos fazem retorrnar à infância. "Teus olhos, meu clarão, me guiam dentro da escuridão, teus passos me abrem o caminho, eu sigo e nunca me sinto só! Você é assim, um sonho pra mim..."
          Mesmo que haja contrastes entre gerações, carregamos, em nossos gens e em nossas atitudes, as suas marcas herdadas de nossos pais, como  expressa a canção de Belchior , eternizada na voz de Eliz Regina: "Não quero lhe falar meu grande amor. Viver é melhor que sonhar. Por isso meu bem, há perigo na esquina. Minha dor é perceber que apesar de termos feito tudo o que fizemos, nós ainda somos os mesmos e vivemos como nossos pais."
          Apesar de cantarolarmos os refrões repetitivos de momento, na verdade, gostamos é da boa música. Como diz a canção, ainda somos os mesmos.... Ainda que busquemos a inovação, a transformação, a revolução de costumes e preferências. O grande perigo, que corremos, hoje, é nos tornarmos cativos de uma mídia alienante e dissociada dos sentimentos verdadeiros. As músicas que elevam sentimentos e exaltam o amor não são  como poeira no vento que duram um só instante e se vão. Elas ficam eternizadas, passam de geração em geração. 

sexta-feira, 6 de abril de 2012

O Gato, uma pintura!


Pintei o gato. Não um gato qualquer. Mas um gato preguiçoso que gosta de dormir e de afiar as unhas no tapete novo da sala. Um gato que tem um nome - Ramon -  e um apelido - Ronron - para os íntimos. Ou, ainda, Romeu, como teima em chamá-lo, o veterinário que o atende.

Ele se basta. Cuida da própria higiene, sai para passear quando se cansa da rotina da casa ou deseja simplesmente apreciar a paisagem. Quando quer agradar, chega de mansinho, ronronando, e se aconchega perto de nós, pedindo um carinho ou atenção.Quando quer dormir, escolhe o melhor lugar, o mais confortável e ventilado e ali deixa-se ficar nas mais enroscadas posições.


Já dizia Aristóteles que o homem é o único animal político. Não concordo. O gato da minha família também o é, no bom sentido da palavra, é claro. Não gosta de confusão. Quando as coisas saem da rotina, ele sai de mansinho, dá uma volta, desaparece por alguns momentos e esconde-se em algum lugar (preferencialmente dentro do guarda-roupas). Depois de algum tempo,  volta, diplomaticamente, querendo chamar a atenção, enroscando-se em nossas pernas.


No decorrer dos séculos, o homem já adorou os animais como se fossem deuses ou os maltratou como se não sentissem dor, medo ou raiva. Porém, como sentia a necessidade de uma companhia sincera, aprendeu a domesticá-los. Hoje em dia, muitos animais domésticos tem as regalias que muitos seres humanos não tem. Em outros casos, ainda são maltratados ou abandonados à própria sorte. Mas isso é assunto para uma outra crônica.