sexta-feira, 25 de fevereiro de 2011

O lúdico e o fabricado

Laptops, jogos eletrônicos, mp3, ipods, DVDs, celulares com múltiplas funções, brinquedos mecanizados ou comandados por controles remotos são alguns dos mimos ofertados hoje pelos pais a seus filhos, desde os seus primeiros anos de idade. Por isso, ao ser convidada, recentemente, para o quarto aniversário dos filhos gêmeos de uma amiga, fiquei em dúvida de como presenteá-los, diante de tamanha parafernália tecnológica que recebem, muitas vezes sem a devida maturidade.

Quando fiz a minha opção por livros impressos (não me lembro os autores) que enfocavam estórias de animais, sinceramente, não sabia qual seria a reação dos homenageados. Mas apostei no fato de as obras escolhidas virem lindamente ilustradas, assim como permitirem uma certa interatividade entre a criança e o livro. Tudo isso me deu coragem de seguir em frente segundo os planos anteriormente traçados.

Qual foi a minha surpresa quando, passados alguns dias, a mãe das crianças me disse que elas adoraram os presentes. Isso mostra que nem tudo está perdido. Brinquedos que vão ao encontro das reais necessidades de seres ainda em formação nunca perdem a validade.

Lembro-me quando, aos sete anos, recebi de meu pai, como presente de Natal, a coleção completa das obras infantis de Monteiro Lobato. Deliciava-me lendo as aventuras de Narizinho, Pedrinho, Dona Benta, Tia Nastácia (hoje em dia querem retirar das escolas o livro Caçadas de Pedrinho por ser considerado racista. Meu Deus, a que ponto chegamos!), Visconde de Sabugosa, Marquês de Rabicó, Emília - a espevitada boneca de pano - e tantos outros. Foi o meu primeiro encontro com a leitura. Desde aí não parei mais.

Viajei por mundos encantados lendo os contos de Hans Christian Andersen (1805-1875), dos Irmãos Grimm (entre 1785 e 1863), de Charles Perraut (1628-1703), as fábulas de La Fontaine (Grécia Antiga) ou de Esopo (1621-1695). A Bela Adormecida, O Gato de Botas, Pequeno Polegar, A Gata Borralheira, Branca de Neve, Os Músicos de Bremmen, O Patinho Feio, A Lebre e a Tartaruga, O Leão Apaixonado, O Lobo e o Cordeiro, entre outras, são estórias que através dos tempos continuam lidas por crianças de todas as idades. Essas estórias nunca caducam, pois estão ligadas aos eternos dilemas que o homem enfrenta ao longo de seu amadurecimento emocional.

É nesse sentido que a literatura infantil e, principalmente, os contos de fadas podem ser decisivos para a formação da criança em relação a si mesma e ao entendimento do mundo à sua volta. Possibilita a compreensão de certos valores básicos da conduta humana ou do convívio social.

Também as fábulas, os mitos e as lendas têm linguagem metafórica que se comunica facilmente com o pensamento mágico, natural nas crianças.

É no encontro com qualquer forma de literatura que os homens têm a oportunidade de ampliar, transformar ou enriquecer sua própria experiência de vida. A literatura apresenta-se não só como veículo de manifestação de cultura, mas também de ideologias.

Hoje a dimensão de literatura infantil está muito mais ampla e importante. Ela proporciona à criança um desenvolvimento emocional, social e cognitivo. Quando as crianças ouvem ou lêem estórias, passam a visualizar, de forma clara, sentimentos que têm em relação ao mundo. As estórias trabalham problemas existenciais típicos da infância, como medos, sentimentos de inveja e de carinho, curiosidade, dor, perda, entre outros.

Quanto mais cedo a criança estabelecer contato com os livros e perceber o prazer que a leitura produz, maior será a probabilidade de ela tornar-se um adulto leitor. O hábito a incita a adotar uma postura crítico-reflexiva, extremamente relevante à sua formação cognitiva.

Num mundo tão cheio de tecnologias que hoje vivemos, onde todas as informações ou notícias, músicas, jogos, filmes, podem ser adquiridos facilmente e consumidos rapidamente, o lugar do livro parece ter sido esquecido. É uma pena que os pais de hoje prefiram dar as coisas prontas, fruto da tecnologia e não das possibilidades lúdicas capazes de abrir a vida interior de indivíduos ainda em formação.

Mas, como em toda a regra sempre há exceções, felizmente para inúmeras pessoas o livro não é considerado coisa do passado e sim do futuro. Na era da Internet, ele ainda ocupa o seu lugar de destaque. A importância da literatura na vida de uma pessoa, o poder que tem uma estória bem contada, os benefícios que uma simples estória pode proporcionar comprovam que não há tecnologia que substitua o prazer de folhar as páginas de um livro e encontrar nelas um mundo repleto de encantamento.

Se a indústria dos brinquedos alinha resultados altamente favoráveis, é bom que se diga que, para conforto de todos nós, que amamos os livros, o número de autores infantis também tem aumentado.

Desde que aprendi a gostar de ler até a vida adulta foram surgindo inúmeros bons autores de literatura infantil como Érico Veríssimo (Os três porquinhos pobres), Maria Clara Machado (Pluft, o Fantasminha), Ana Maria Machado (Bisa Bia, Bisa Bel), Ruth Rocha (Marcelo, marmelo, martelo), Ziraldo (O menino maluquinho), só para citar alguns.

Ao dar presentes industrializados, um pai pode colocar seu filho conectado com os avanços tecnológicos. Mas se desejar dar elementos para que ele venha desenvolver consciência crítica e analítica, criatividade e inventidade, a partir de um universo lúdico, de tal modo que ele seja capaz de construir uma vida interior fértil e se torne um adulto dotado de maturidade e equilíbrio, o caminho certo é lhe levar ao mundo dos livros.

Por certo os autores, lidos em minha infância, contribuíram para a formação de meu colar de pérolas. Hoje posso atestar essa veracidade pelos presentes que dei a duas crianças de quatro anos. Mesmo cercados por um contexto criado pela indústria, podem se deliciar com as páginas de um livro e interagir com suas figuras, montando quebra-cabeças e levando o seu universo por mares nunca navegados.

sábado, 19 de fevereiro de 2011

Beleza


A natureza é uma dádiva de Deus. Cabe a nós harmonizarmo-nos com ela.


No final da curva, novas surpresas. Esteja atento. Passa por aqueles que não vêem e ...contempla!



O melhor conhecimento é o do coração.

Paisagem

sexta-feira, 18 de fevereiro de 2011

Reencontros

Qual a contribuição da família na construção social brasileira? A discussão é ampla e interminável. Mas uma coisa tenho certeza: a família como a conhecemos está mudando. Constituída desde os tempos da ocupação do território brasileiro, ela tem suas principais raízes na sociedade patriarcal rural.

À medida que ocorreu o processo de migração campo-cidade, em meados do século XIX, prolongando-se pelo período de um século, ela assume novos ares e, mais recentemente, com o fenômeno da metropolização, a composição familiar diminuiu drasticamente, através de células onde os indivíduos não mantém mais o vínculo genealógico com seus ascendentes. É o chamado fenômeno da impessoalização.

Avós, pais, filhos, netos, tios, primos perdem seus vínculos. Agora é o filho que cresce e migra, os pais que se separam, a violência que atinge principalmente os integrantes masculinos, as mulheres que passam a ser arrimos de famílias. Crianças de pais diferentes e mesma mãe, ou vice-versa, são criados na mesma casa, porém sem os mesmos vínculos afetivos.

Sinais dos tempos, que afastam da memória tempos imemoriais onde natais, aniversários e casamentos reuniam indivíduos de mesma consangüinidade. E hoje me pergunto: qual a importância dos primos em nossas vidas?

A antiga família de muitos irmãos e primos nos dava a certeza da segurança e o embasamento afetivo balizador para criarmos bons referenciais capazes de nos levar a nos tornarmos adultos conscientes e equilibrados.

E hoje, que significado tem os primos na vida dos contemporâneos? Para isso convido você a entrar em qualquer site de busca e digitar a palavra “primas” para se surpreender com a conotação pejorativa que essa palavra assume.

Assim, nem tanto à la Gilberto Freyre, de “Casa Grande & Senzala”, nem mesmo Nelson Rodrigues, inspirado naquele autor, nem mesmo o simbolismo degenerado que aparece pelo menos em parte das redes sociais, possuo um sentido verdadeiro para o tema, fruto de minhas sadias relações familiares.

Minhas recordações me levam à segurança do contexto onde nasci, desenvolvi minhas primeiras impressões e transcendi os limites da adolescência para uma vida adulta feliz e bem constituída.

Há trinta e seis anos não via a minha prima Denise. Nas férias deste janeiro, resolvemos meu marido e eu visitar a minha tia Nilda, rever minha prima e seu esposo e conhecer os filhos do casal. A sensação que eu tive, ao encontrar minha prima foi a de que apesar da distância física imposta por muitos anos, o afeto não se perdeu. O mesmo carinho, a mesma cumplicidade, a mesma mania de bater longos papos e dar risadas sem saber nem o motivo.

Parece que o tempo não passou!” afirmávamos surpresas, enquanto tentávamos colocar em dia todos os aspectos vivenciados nesses anos em que não nos vimos. É claro que já não somos as mesmas. Amadurecemos. Crescemos. Sofremos. Lutamos. Amamos. Perdemos. Achamos. Ganhamos. Choramos. Rimos. Enfim, vivemos. Resgatamos os laços e estabelecemos novas referências, com a promessa de nos vermos mais frequentemente.

Janeiro foi o mês dos encontros familiares. Inspirada por essa experiência tão gratificante, seguimos viagem. Mais ao Sul do Brasil encontramos outras primas (Ione, Iza, Lu, Tereza, Celina, Elisa, Denise, Raquel, Isadora, Zilá e Lourdes). Passei com elas tardes agradáveis para não perder a regularidade de convívio cada vez que volto à terra onde nasci. Apesar dos anos passados e cada uma ter seguido a sua vida, os reencontros são regados com a mesma alegria e temperados com recordações.

E assim vou reabastecendo as minhas energias. A cada uma de minhas primas agradeço os momentos de atenção, de carinho, de cumplicidade. Cada uma, com sua maneira de ser, de saber driblar as vicissitudes da vida, de contar suas histórias, contribuiu para que eu voltasse para casa mais fortalecida.

Li certa vez um texto atribuído à Madre Tereza de Calcutá: “Às vezes, pensamos que a pobreza é apenas fome, nudez e desabrigo. A pobreza de não ser desejado, não ser amado, e não ser cuidado é a maior pobreza. É preciso começar em nossos lares o remédio para esse tipo de pobreza... A mais terrível pobreza é a solidão e o sentimento de não ser amado”.

Mesmo com as novas formas de constituição familiar que hoje obedecem a novos paradigmas, acredito que o objetivo de uma família continua sendo o mesmo: a construção dos afetos,a formação da identidade de um indivíduo e a sua socialização a partir de seu núcleo de formação.

Graças aos parentes, nossa família tem história, caso contrário poderíamos nos tornar uns deserdados. Soltos no ar, sozinhos. Quando em uma família existe uma cultura familiar própria, quer dizer, uma série de valores e crenças vividos realmente, a convivência entre os primos se solidifica, os laços se formam. A unidade da família se potencializa e nós, junto a nossos primos, nos vemos parte de um universo comum, talvez mais humano.