sábado, 13 de novembro de 2010

Colar de Pérolas


“Com as lágrimas da minha tristeza eu enfiarei um colar de pérolas

para o teu colo, minha mãe. As estrelas forjaram argolões de luz

para enfeitar os teus pés, mas a minha há de ficar sobre o teu seio.

Riqueza e fama vêem de ti e a ti compete dá-las ou recusá-las.

Mas esta minha tristeza é toda absolutamente minha e,

quando eu a levo, em oferenda a ti,

tu me retribues com a tua graça”.

Ao procurar um nome para este blog, fui inspirada pelo texto do poeta indiano Rabindranath Tagore (1861-1941), não só por sua beleza e por sua sensibilidade, no uso de suas palavras, mas pelas imagens que me vieram à mente quando o li.

Já há algum tempo queria escrever sobre pessoas e acontecimentos que marcaram a minha caminhada e que, de uma maneira ou de outra, contribuíram para ser quem sou. Assim, pensei em registrar, aos poucos, as experiências vividas, como forma de fazê-las compartilhar com todos aqueles que visitam este espaço.

Uma a uma as recordações foram brotando e, na minha imaginação, foram formando um colar de pedras preciosas, mais precisamente de pérolas, as minhas preferidas.

A maioria das jóias é feita usando-se metais e pedras preciosas, como o ouro, a prata e o diamante, dádivas brutas da mãe natureza, que precisam ser lapidadas, a partir da criação humana. Já as pérolas são jóias que, para mim, lembram o interior de um ser, as coisas do coração. Sempre me fascinaram, pois são confeccionadas a partir de uma matéria-prima diferente, encontrada dentro de uma criatura viva, a ostra.

Para entender melhor a analogia que faço, ressalto que as pérolas são o resultado de um processo biológico. É a maneira que a ostra encontra para se proteger de substâncias estranhas. E é curiosa a forma como a ostra se defende. Quando um parasita invade seu corpo, ela libera uma substância chamada madrepérola, que se cristaliza sobre esse elemento estranho, impedindo-o de se reproduzir. Após um período que dura, em média, três anos, esse material se solidifica, formando uma pérola. Sua forma depende do formato do invasor e sua cor varia de acordo com a saúde da ostra.

As ostras não são os únicos moluscos que produzem pérolas. Raramente mexilhões e amêijoas (espécies de mariscos) também podem gerá-las. A maioria das pérolas, no entanto, é produzida pelas ostras, tanto em ambientes de água doce quanto de água salgada.

Existem as pérolas naturais e as cultivadas. As naturais, por definição, são encontradas, por mergulhadores ao acaso, sem qualquer interferência humana em sua formação. São confeccionadas estritamente pela natureza. São muito raras e o trabalho de prospecção é tão difícil que, desde 1916, elas não são mais procuradas. Por isso alcançam altíssimo valor no mercado.

Para se ter uma idéia, há registros de que, no apogeu do império romano, quando a febre do uso de pérolas estava no auge, o general romano Vitellius financiou um exército militar vendendo apenas um dos brincos de sua mãe.

Atualmente, as pérolas estão mais acessíveis à comercialização. Quase todas são cultivadas. Em relação à sua aparência, em nada diferem das naturais, no que tange à beleza, textura e durabilidade. Porém, há a intervenção humana de injetar no interior das ostras parasitas invasores que deflagram o processo. Somente um especialista pode diferenciar uma pérola natural de uma cultivada, atestando, assim, o seu valor comercial.

Como a ostra que se fecha e solidifica o intruso, levando certo tempo para acontecer o aparecimento da pérola, também vivenciamos nossos processos internos que nos levam ao autoconhecimento. Nossos sonhos reais e nossas falsas expectativas são testadas por nossas experiências e confrontadas com a realidade para se solidificarem ou não na formação de nossa identidade. Conduzidos por nossa intuição, vamos dando forma aos nossos ideários por meio de muito trabalho e dedicação.

Sempre que nos conscientizamos de nossos sentimentos verdadeiros ou conseguimos nos unir com uma parte importante de nós mesmos, o futuro se afigura, diante de nós,com possibilidades infinitas. Porém é necessário que disponhamos de tempo, que façamos escolhas cuidadosas e que enfrentemos trabalho pesado para que as possibilidades se concretizem.

Assim como a pérola legítima - natural ou cultivada - é o resultado de uma fantástica criação da natureza, o ser humano também passa por lapidação até chegar à sua maturidade emocional e afetiva e alcançar a sabedoria. Tal qual ostras, que vão construindo a sua obra-prima, minhas recordações vão brotando em meu coração e vão solidificando minha existência, possibilitando que eu repense e avalie minhas atitudes e os acontecimentos nos quais me envolvi. Dessa forma, vou enfiando as contas, prazerosamente, uma a uma, em um resistente fio, formando o colar de minha vida que, com alegria e oferenda, coloco no colo daqueles que me lêem.

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