terça-feira, 1 de novembro de 2011

Vida & Morte

“... pois, o que é morrer senão expor-se, desnudo, aos ventos e dissolver-se no sol?

Neste dia de Finados veio-me à mente essa frase de Gibran Kalil Gibran. Posso imaginar a liberdade que sente aquele que se desprende da matéria e integra-se plenamente ao Todo. Para mim a morte é isso. É o encontro com o infinito.

Não pretendo aqui escrever sobre coisas tristes e nem chorar por aqueles que se foram. Pelo contrário, vou festejar a vida. Vou festejar a vida daqueles que já partiram e nos deixaram lembranças e exemplos que guardamos no coração.

Prefiro seguir na contramão dos costumes do Ocidente e caminhar para um sentido mais abrangente, assim como os orientais, que acreditam ser a morte algo natural. Pois, como diz Gibran, a vida e a morte são uma e mesma coisa. Assim como o rio e o mar são uma e a mesma coisa.

Minhas lembranças de infância guardam este contraste. Naqueles tempos, não se podia ouvir música, pois o dois de novembro era um dia reservado ao recolhimento. As rádios tocavam somente músicas sacras ou clássicas. Ficava no ar uma tristeza inexplicável. Nós, crianças, não podíamos fazer gritarias nas brincadeiras. Tudo isso em respeito aos mortos. O dia parecia mais pesado. Até hoje nunca entendi aquilo direito.

Mas hoje tudo mudou e este dia, para muitos, passou a ser só mais um, mas um especial por ser feriado, onde se pode aproveitar a praia, beber uma cerveja com os amigos ou ficar em uma roda de samba curtindo a batucada. Para outros viver esse dia é seguir a tradição, e chorar os seus falecidos ou esperar a sua vez. É dia de levar flores ao cemitério ou mandar rezar uma missa.

Nem uma coisa nem outra.

Afinal, morremos e nascemos a cada dia. E assim vamos percorrendo ciclos, superando etapas, constituindo e desfazendo relacionamentos, alimentando sonhos e confrontando realidades, revendo atitudes, aperfeiçoando maneiras de operar no mundo, sempre em busca de superarmos nossos limites. Ciclos e etapas.

A vida pode ser comparada a um contínuo desfilar de mortes. Começa pela partida do bebê deixando o aconchego do útero materno para enfrentar a realidade da existência física. A infância deve morrer e dar lugar à adolescência. A juventude, embora com esforço para mantê-la com exercícios, medicamentos, cosméticos ou cirurgias, um dia terá de morrer dando lugar à maturidade da meia idade. E, em seu prolongamento, o grand finale indicando que é hora de voltar para onde viemos. Para onde? Entre o mito e a realidade, haveremos de fixar os momentos infinitos sempre no presente, para, enquanto estivermos aqui, termos consciência da totalidade.

E, parafraseando Gibran, podemos dizer que, se quisermos conhecer o segredo da morte, só podemos descobri-lo se o procurarmos no coração da vida.

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